10 de ago. de 2020

A velha capoeira morreu?

 

A "velha capoeira" morreu?

Por: Mestra Brisa e Mestre Jean Pangolin

 

A resposta para a pergunta do título carece de um cuidado reflexivo grande, pois, salvo melhor juízo, poderemos nos precipitar em ódio ou em jargões para responder, e isso só irá confundir a análise mais ainda, considerando a negação de que o "velho" deve estar no novo, e o "novo" deve estar no velho. Convidamos vocês a reflexão a seguir.

 

Quando pensamos na "velha capoeira" nos lembramos, invariavelmente, dos antigos mestres da arte, logo, pela ciência de que não existe ancestralidade sem a referência direta e/ou indireta deles, não é possível que a "velha capoeira" tenha morrido, pois os antigos são o sustentáculo da capoeiragem e seguem vivos fisicamente e em filosofia para muitos de nós.

 

Outro aspecto importante é que, para muitos, todo o cabedal ancestral de herança dos antigos figura como algo do passado, ultrapassado, arcaico e sem valor. Neste sentido, para estas pessoas, de fato a "velha capoeira" morreu, pois os princípios defendidos por uma referência ancestral foram paulatinamente sendo preteridos em função de uma economia de mercado e em favor do lucro.

 

Para várias pessoas a "velha capoeira" já morreu faz tempo, portanto, sejamos maduros criticamente, pois de nada serve ficar com raiva quando alguém diz: "A velha capoeira morreu", e continuar matando os antigos dentro de nós, com uma indignação FAKE, na qual desejamos SALVAR o "mestre antigo de lá de longe", mas não conseguimos perceber a necessidade de nosso próprio mestre.

 

Para matar a "velha capoeira" basta não se referenciar nos antigos no jogo, no toque, no canto, na filosofia, basta acreditar, por exemplo, que formações online podem substituir a força do ensinamento presencial deles. Neste sentido, são muitos os sinais de que estamos, nós mesmos, matando a "velha capoeira". Quer saber mais? Quando seu cantar tem mais de Roberto Carlos, ou de um famoso qualquer que sustente a voz com longos graves ou agudos, do que o balanço melódico de Mestre Boca Rica, ou a força da oralidade da cantiga do Mestre Waldemar da Paixão...

 

Quando você está mais preocupado em qual sequência de movimentos irá realizar no jogo A ou B, do que na compreensão do que rege a lógica de jogo de um mestre Camisa Roxa, sempre com entradas e saídas inusitadas e perigosas. Quando mais importa apontar os defeitos dos companheiros da arte, do que entender como o mestre João Pequeno de Pastinha conseguia reunir tantas diferenças em um único salão, garantindo a premissa do respeito mútuo.

 

Se a velha capoeira morreu, pensemos numa sessão espírita, na qual invocamos a espiritualidade dos mais antigos pelo médium presente. Neste exercício imaginativo, te convido a buscar o axé de uma boa roda, com a "mediunidade" de um berimbau bem tocado, como canal de comunicação com o mundo dos mortos... Te garanto, vai perceber a FORÇA e AXÉ desta velha capoeira, que julgas morta, mas que irá te embebecer de vida pela ancestralidade, ritualística dos antigos em ação.

 

Então, para aqueles que anunciam a nossa morte, nós lhe convocamos a visitarem o "mundo dos mortos" chamado Bahia... Aqui pra nós... O perigo será você não querer nunca mais voltar ao mundo dos vivos da "capoeira BIGMAC" pela força do axé - que vai amarrar seu pé, com negaça, mandinga, oralidade, memória, ancestralidade, circularidade e respeito a diversidade.

 

Axé!

 

 

Áudio: Feed RSS: https://www.spreaker.com/show/4484388/episodes/feed


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